domingo, 5 de abril de 2009

Oh Tchékhas!, havias de dar um salto ali na rua da alegria!

Nunca partilhei do entusiasmo de Kátia pelo teatro. A meu ver, se a peça for boa, para produzir o efeito desejado não há necessidade de obrigar os actores a trabalhar: basta que a leiamos. Ora, se a peça for má, nenhuma interpretação a fará melhor.
Na minha juventude ia muito ao teatro e, ainda agora, a família compra um camarote e leva-me a "refrescar" ao teatro duas vezes por ano. Isto não basta, claro, para ter o direito de opinar sobre teatro, mesmo assim direi duas palavras. Penso que o teatro não está melhor do que era trinta ou quarenta anos atrás. Tal como antes, não consigo encontrar nos corredores ou no átrio um copo de água pura. Tal como antes, a camaroteira espeta-me com uma multa de vinte copeques pela minha peliça, embora nada haja de censurável em vestirmos roupa quente no Inverno. Tal como antes, nos intervalos toca sem qualquer necessidade uma música que só adiciona à impressão que nos está a produzir a peça mais uma impressão que não era para cá chamada. Tal como antes, os homens vão ao bufete à procura de bebidas alcoólicas. Ora, se não é possível o progresso em coisas pequenas, seria inútil procurá-lo nas importantes. Quando um actor, emaranhado dos pés à cabeça em preconceitos teatrais de todo o género, tentar ler o monólogo simples e normal "Ser ou não ser", não de um modo simples e normal mas, sabe-se lá porquê, obrigatoriamente sibilando e convulsionando o corpo todo, ou quando tenta convencer-me a todo o custo que Tchátskim que não pára de conversar com parvos e está apaixonado por uma parvalhona, é um homem muito inteligente, e que "A Desgraça de ser inteligente" não é uma peça enfadonha, sopra-me do palco aquela mesma rotina que já me aborrecia quarenta anos atrás, quando me serviam uivos clássicos e bater de punhos no peito.


in Contos de Tchékhov

3 comentários:

direitoÀcena disse...

Gostei do tom o coloquial tu-cá-tu-lá com o Tchékhas ;-)

E estou a ver o dito, a espantar o seu mónoculo se de facto passasse pela rua da alegria a ouvir: "Olga, Olguinha, vem cá, Olguinha!"

(ln)

Liliana Borges da Costa disse...

ele não gosta do teatro versão "separados por uma coluna". é como nós!
(lbc)

Joana Neto disse...

Tinha que vir a Olguinha ao barulho... Ele no fundo, no fundo, até gosta dela... lol